quinta-feira, 8 de maio de 2025

 

Preventiva não pode se basear apenas em gravidade do delito, decide desembargador

7 de maio de 2025, 19h18

A gravidade do delito, por si só, não justifica a prisão preventiva. Sua decretação precisa estar amparada em circunstâncias pessoais que permitam classificar o acusado do crime como perigoso. Do contrário, a medida se transforma em cumprimento antecipado da pena, antes mesmo do contraditório e da ampla defesa no processo.

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Mãos de detento segurando grades da prisão

Para desembargador, decisão de primeira instância não demonstrou que o homem era perigoso

Com esse entendimento, o desembargador Luiz Antônio Alves Capra, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, substituiu, em liminar, a prisão preventiva de um homem acusado de tráfico de drogas por medidas cautelares.

Ele precisará se apresentar todos os meses em juízo para informar e justificar suas atividades, comparecer a todos os atos processuais a que for intimado e manter endereço e telefone atualizados. Também não poderá sair da comarca em que mora sem autorização judicial, nem se envolver em novas ocorrências policiais.

O homem foi preso em flagrante por tráfico. Após a audiência de custódia, a 4ª Vara Criminal de Canoas (RS) converteu a prisão em preventiva. A defesa contestou a decisão.

Capra ressaltou que a prisão preventiva só pode ser decretada se for indispensável. E isso precisa estar devidamente descrito na decisão.

Na sua visão, o juízo da vara criminal “não descreveu um contexto indicativo de efetiva periculosidade do paciente, excepcional, além dos elementos característicos do crime imputado”. O desembargador destacou que o acusado é primário.

Quanto à gravidade do crime e “seus reflexos sociais”, o magistrado entendeu que a preocupação da vara criminal “confunde-se com aquelas do legislador ao criar os tipos penais” pelos quais o homem já é investigado.

Segundo o desembargador, a gravidade do fato não pode ser ignorada, mas a decretação da prisão preventiva “nada tem a ver com tal circunstância”.

O Superior Tribunal de Justiça já decidiu que a menção à gravidade do crime em abstrato ou à comoção social gerada por ele e à necessidade de se dar uma resposta à criminalidade não justificam prisões preventivas.

Atuaram no caso as advogadas Ariella Cappellari e Emillin Néri, ambas do escritório Monteiro Advocacia, e Francieli Valim.

De acordo com Ariella e Emillin, a prisão preventiva deve ser excepcional e aplicada “somente quando demonstrada sua imprescindibilidade para a tutela da ordem pública, da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, o que não se verifica no presente caso”.

quarta-feira, 30 de abril de 2025

Por que o advogado deve usar a expressão 'pela ordem'?

  É sabido que o Advogado é indispensável à administração da justiça, em conformidade com o disposto no artigo 133 da Constituição Federal. Ademais, é notório também o fato de que a função da advocacia exige combatividade e destemor daquele que exerce tal profissão.

 Diante da necessidade de uma atuação combativa e destemida, certamente todo advogado que milita nos fóruns e tribunais acabará sujeito à prerrogativa prevista no inciso X do artigo 7º da Lei n.º 8.906/94, a qual prevê:

 Art. 7º São direitos do advogado:

X - usar da palavra, pela ordem, em qualquer juízo ou tribunal, mediante intervenção sumária, para esclarecer equívoco ou dúvida surgida em relação a fatos, documentos ou afirmações que influam no julgamento, bem como para replicar acusação ou censura que lhe forem feitas.

A utilização da expressão pela ordem é deveras essencial ao exercício profissional, vez que garante ao advogado o direito de se manifestar, de forma imediata, contra quaisquer questões envoltas ao seu labor, seja para solução de um simples equívoco ou dúvida, até para casos mais exacerbados de ofensas e acusações ocorridas durante sessões ou audiências.

 A existência de situações que ensejam tal forma de intervenção do advogado são infinitas, porém, para o presente texto, cabem alguns exemplos, de forma a permitir uma fácil visualização.

 EXEMPLO 1

 Um exemplo de situação corriqueira seria, em determinada audiência, um magistrado, no ato de proferir sentença de forma oral, acabar por, durante sua explanação apresentar fundamento em um sentido, vindo a equivocar-se em determinada palavra, sendo tal situação constatada pelo advogado que, utilizando da expressão pela ordem, indica o equívoco, possibilitando que o magistrado conclua seu raciocínio da forma que melhor entendia.

 Veja que, no exemplo, não há qualquer influência na decisão do magistrado, mas, sim, meramente a reparação de um erro momentâneo, onde se teve a clara intenção de dizer uma coisa, mas acabou por dizer palavra equivocada.

 A utilização da expressão pela ordem, neste exemplo, acaba por evitar ainda uma morosidade desnecessária ao caso, até porque, se o advogado se mantivesse inerte, posteriormente teria de recorrer da decisão para correção do erro material.

 EXEMPLO 2

 Já uma situação um pouco mais complicada poderia ser exemplificada em determinado procedimento do Tribunal do Júri, onde os debates são, normalmente, mais acalorados.

 Imagine que o representante do Ministério Público, em eventual réplica, para tentar derrubar os argumentos levantados pela defesa - anteriormente explicitados ao Conselho de Sentença - passa a proferir palavras que ofendam a atuação do defensor (por exemplo, argumentar que a defesa não possui respeito para com o caso, com mero intuito de induzir os jurados a apenas pensar em condenar, sem qualquer conteúdo prático ou qualquer plausibilidade com os argumentos da defesa).

 Em tal situação, deverá o advogado utilizar da expressão pela ordem para cessar imediatamente tal forma de acusação proferida, de modo a manter o pleno respeito que deve permear o jogo processual.

 Vale destacar que o profissional não deve se furtar à utilização da expressão pela ordem, vez que tal prerrogativa é essencial à manutenção do respeito e da ordem processual, possibilitando que o Advogado tenha garantida a possibilidade de manter atuação combativa no interesse de seu cliente, afastando abusividades eventualmente praticadas por outrem.

 Noutro giro, tem-se importante o devido cuidado do profissional para com relação à utilização de tal prerrogativa, de modo que esta seja utilizada nos momentos mais oportunos, garantindo o devido respeito ao profissional.

 Assim, é de extrema importância ao advogado ter garantida a prerrogativa da utilização da expressão pela ordem, de modo a impedir que nos processos em que atue venha a se ter equívocos ou abusividades com relação à atuação do profissional, servindo desde a correção de mero equívoco, até para cessar com abusividades praticadas por outrem.

 Dessa feita, e pela ordem, avancemos na luta em defesa das prerrogativas!

 Fonte: Canal Ciências Criminais

A prisão preventiva como devir sancionatório - • Tallis Lara - 29 de abril de 2025, 17h17

Com a implementação da Lei Federal 13.964/19 (pacote anticrime), mais precisamente, no parágrafo 2o, do artigo 313 do Código de Processo Penal, a prisão preventiva com “finalidade de antecipação de cumprimento de pena ou como decorrência imediata de investigação criminal ou da apresentação ou recebimento de denúncia”, deve ser inadmitida.

Resolvido. A lei pôs fim a décadas de rompimento com a Constituição e fez revigorar a maltratada presunção de inocência. O encarceramento automático, amiúde a “bem do combate ao crime” teve fim com a exigibilidade de requisito e fundamento que extrapolem o próprio existir de uma persecução penal. Está resolvido, certo? O óbvio foi dito? Espere. Lembremos do “interpretar condicionado” do Estado-juiz em que nada é o que parece ser, mesmo as leis mais claras e impositivas suportam um “se”.

Expressões como “prisão com objetivo de interromper a atuação das facções criminosas”, “prisão justificada na necessidade da garantia da ordem pública ante o envolvimento do crime organizado” e “prisão adequada porque envolve a participação em organização criminosa de alta periculosidade”; têm sido cada dia mais recorrentes nas cortes como fundamento para segregação cautelar.

Violação ao dever de motivação

A violação ao dever de motivação é patente, expressões símiles não atendem ao mandamento do inciso IX, do artigo 93 da Constituição e menos ainda à imposição do artigo 315 do CPP. Fundamentação que se aplica a qualquer caso e utiliza do próprio tipo penal como suficiente ao encarceramento cautelar (raramente provisório) deve(ria) ser tida por imprestável ao processo penal, isso pois, não atinge o dever de fundamentação das decisões judiciais e rompe com o due process of law (artigo 5º, inciso LIV, Constituição).

Com isso, não se quer dizer que tais expressões não possam ser utilizadas na decisão que decreta ou mantem a prisão, o que não pode se permitir é a utilização dessas expressões como suficientes à segregação. Devem ser argumentação-meiojamais, argumentação-fim.

Isso é dizer, deve-se confrontar essas expressões, por si, genéricas, com outros elementos do caso concreto, elementos que diferenciem o caso em análise de todos os outros casos, fórmulas genéricas podem ser usadas para corroborar a decisão que determina a segregação, enquanto subsidiárias (argumentação-meio) ao fundamento principal que revela o periculum criado (argumentação-fim).

Contemporaneidade do fato

Outro grande problema quando se fala de prisão preventiva em casos de organização criminosa é o afastamento da contemporaneidade do fato. Com crescente jurisprudencial, o entendimento majoritário é de que o artigo 2o da Lei 12.850/13 é crime permanente, portanto, afastado o critério da atualidade dos fatos.

Em nosso sentir, a adoção do critério classificatório do crime (se é permanente, instantâneo, material, formal etc.) não deve servir como fundamentação válida a afastar a disposição legal do § 1º, do artigo 315 do CPP, onde é expresso: “Na motivação da decretação da prisão preventiva ou de qualquer outra cautelar, o juiz deverá indicar concretamente a existência de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)”.

Nos parece que a criação jurisprudencial para justificar a prisão por fatos praticados em data longínqua malfere o dispositivo processual penal mencionado, além de romper com o prisma teleológico da medida cautelar. Isso porque, se o fato é antigo e ausentes elementos concretos de razões novas ou contemporâneas de persistência na prática criminosa, não se pode entender por atendido o periculum libertatis.

Lembremo-nos que o periculum não é requisito das medidas cautelares, mas sim seu fundamento, porquanto, no processo penal, a aplicação é diversa da adotada no processo civil quando abordamos as medidas coercitivas pessoais. O periculum in mora de lá (CPC) não deve ser importado para cá (CPP), uma vez que não se trata de perigo criado pelo atraso inerente ao decurso do tempo até que recaia sentença definitiva no processo, e, sim, do perigo que decorre do estado de liberdade do acusado. Portanto, para a sistemática processual penal, não é sobre lapso temporal entre o provimento cautelar e o definitivo, sem embargo, é sobre a situação de perigo criada pela conduta (atual ou contemporânea) do imputado. [2]

Devir sancionatório

Por essas ponderações fica ainda mais evidente a invalidade da fundamentação posta no entendimento de que fatos praticados por organização criminosa denotam mais gravidade e dispensa da atualidade do perigo, isso, pois, decisões assim não atendem ao caso concreto e se prestam a (in)fundamentar qualquer caso, posto que, genéricas e imotivadas.

A fim de exemplificar a tese aqui defendida: se um acusado do cometimento do crime de integrar organização criminosa (artigo 2o da lei 12.850/13) em 2017, tem sua prisão preventiva decretada em 2025, sob argumento de que a prisão é necessária para resguardar a ordem pública porque envolve a participação em organização criminosa de alta periculosidade, ainda que não tenha qualquer elemento de que continuou na organização criminosa ou persistiu em outra, e; outro acusado em semelhante situação, exceto pelo tempo do fato e antecedentes, este praticado em 2024, tem sua prisão preventiva também decretada. Pergunta-se: qual decisão desperta maior segurança quanto à aplicação das normas?

É proporcional que o acusado pelo cometimento de fato ocorrido há quase dez anos, que seguiu sua vida longe de qualquer notícia de prática delituosa, suporte a mesma medida aplicada a alguém que foi acusado de praticar o mesmo delito há menos de um ano e possui antecedentes?

Se a resposta à última pergunta for positiva, encaremos que se trata de aplicação da medida pessoal coercitiva para fins de antecipação de cumprimento de pena ou como decorrência imediata de investigação criminal, uma vez que nos dois fatos a semelhança é o delito imputado.

Logo, nada mais adequado que definir a prisão preventiva como devir sancionatório.

Devir, do latim devenire, vir-a-ser, tornar-se [3]; o conceito filosófico que se amolda ao presente estudo, enquanto processo de transformação constante. Da prisão cautelar (situação de perigo criada pela conduta atual ou contemporânea do acusado) que torna-se prisão em caráter de sanção, vez que fundamentada tão somente na conduta imputada.

De modo que, a depender do tipo penal — mormente os da Lei 12.850/13 e Lei 11.343/06 —, as cortes são mais tolerantes às decisões genéricas e desprovidas de elementos do caso concreto.

Uns crimes são maiores

Isso é dizer, há crimes que são mais crimes que outros. Por isso, a análise e enfrentamento às razões lançadas pela acusação surtem mais efeito quando elencadas nas mencionadas leis criminais. Em nosso sentir, como já dito, tais fundamentos tornam a decisão nula por não atender ao dever de fundamentação das decisões judiciais.

Em conclusão, no início deste artigo foi apresentada a Lei Federal 13.964/19, que expressamente disse o óbvio e proibiu a prisão preventiva com “finalidade de antecipação de cumprimento de pena ou como decorrência imediata de investigação criminal ou da apresentação ou recebimento de denúncia” (§ 2º, 313, CPP). Portanto, não nos parece que a-lei-não-disse-aquilo-que-tinha-que-dizer, do contrário, disse-tudo-aquilo-que-tinha-que-dizer, posto que o que falta é boa vontade e seriedade do julgador ao realizar o enfrentamento ao pleito de prisão cautelar, enquanto magistrados(as) se deixarem seduzir pelo “canto das sereias” (Streck), prisões injustas seguirão sendo decretadas e reautorizadas pelas Cortes país afora.

É necessário romper com o devir sancionatório. Prisão cautelar é excepcional e deve ter deferimento excepcional, o juiz pode lançar mão da grave prisão quando esgotadas as outras medidas diversas (319, CPP), porquanto, a prisão é sempre medida residual.

 [1] Nesse sentido: STJ – AgRg no RHC: 198290 SC 2024/0180909-9, Relator.: Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, Data de Julgamento: 12/08/2024, T6 – SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/08/2024;

TJ-PA – HABEAS CORPUS CRIMINAL: 08184404420238140000 18298676, Relator.: ROMULO JOSE FERREIRA NUNES, Data de Julgamento: 27/02/2024, Seção de Direito Penal.

[2] LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal. 20 Ed. Saraiva Jur. São Paulo. 2023, p. 692.

[3] https://michaelis.uol.com.br/busca?id=XWKq

quarta-feira, 9 de abril de 2025

 máxima proteção

Congresso aumenta pena por homicídio ou lesão contra juiz ou membro do MP

8 de abril de 2025, 22h08

A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (8/4) um projeto de lei que torna qualificados os crimes de homicídio e lesão corporal dolosa praticados contra membros do Ministério Público ou da magistratura em razão do exercício da função ou em decorrência dela. A proposta será enviada à sanção presidencial.

Kayo Magalhães/Câmara dos Deputados
Congresso aumentou a pena por homicídio ou lesão contra juiz, defensor público, promotor e oficial de Justiça

Para o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), o projeto reconhece a importância dos profissionais

Os deputados aprovaram em Plenário três emendas do Senado que incluem os membros da Advocacia-Geral da União, os procuradores estaduais e do Distrito Federal, os oficiais de Justiça e os defensores públicos nessa lista sobre qualificação dos crimes.

O texto que irá à sanção é um 
substitutivo do relator, deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA), para o Projeto de Lei 4.015/2023, do ex-deputado Evandro Rogério Roman (PSD-PR). Pereira Júnior disse que não seria justo contemplar apenas duas categorias com as garantias. “A luta incessante dessas categorias foi o que permitiu a aprovação da matéria”, declarou.

Segundo o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), a casa faz justiça a categorias importantes, que ajudam na atuação do Judiciário como um todo. “Incluir os oficiais de Justiça, os defensores públicos e os advogados públicos é uma maneira de igualar as carreiras e reconhecer a importância desses homens e mulheres ajudando em um Judiciário mais eficiente.”

Aumento de pena

No Código Penal (Decreto-Lei 2.848/1940), o homicídio qualificado prevê pena de 
reclusão de 12 a 30 anos. O agravante proposto pelo projeto poderá ser aplicado ainda quando o crime for cometido contra cônjuge, companheiro ou parente, inclusive por afinidade, até o terceiro grau, em razão desse parentesco com os detentores dos cargos citados. Já a lesão dolosa terá aumento de pena de um terço a dois terços nas mesmas situações.

O texto também considera o homicídio qualificado, a lesão corporal gravíssima e a lesão seguida de morte contra essas pessoas.

Segundo o Código Penal, são consideradas lesões de natureza gravíssima aquelas das quais resultam incapacidade permanente para o trabalho; enfermidade incurável; perda ou inutilização de membro, sentido ou função; deformidade permanente; ou aborto.

Condenados por crimes hediondos não podem contar com anistia, graça e indulto ou fiança, e a pena começará a ser cumprida em regime fechado.

Medidas de proteção

As emendas aprovadas incluem, junto com membros do Ministério Público e da magistratura, as atividades dos defensores públicos entre aquelas consideradas de risco permanente, independentemente de a área de atuação ser penal ou extrapenal.

A garantia de confidencialidade de suas informações cadastrais e de dados pessoais e de familiares indicados pelos magistrados, defensores públicos, membros do Ministério Público e oficiais de Justiça passa a ser uma diretriz da política de proteção, juntamente com a garantia de escolta e de aparatos de segurança disponíveis que possam ajudar em sua proteção.

A proteção especial deverá ser solicitada à polícia judiciária por meio de requerimento instruído com a narrativa dos fatos e eventuais documentos pertinentes. O processo sobre esse pedido tramitará com prioridade e em caráter sigiloso, devendo as primeiras providências serem adotadas de imediato.

Segundo o projeto aprovado, os membros da AGU e das procuradorias estaduais não contarão com essas medidas de proteção, pois as emendas não contemplaram essas categorias. Com informações da Agência Câmara.

Pescaria do MP

 STJ vê pesca probatória e anula provas contra médica acusada de antecipar mortes em UTI

São nulas as provas decorrentes da busca e apreensão de 1.670 prontuários médicos do Hospital Evangélico de Curitiba que embasaram mais de 80 inquéritos e ações penais contra uma médica acusada de antecipar mortes de pacientes, uma vez que houve no caso a prática de pesca probatória.

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Juíza explicou que ações por eventuais erros médicos ocorridos na rede pública devem ser ajuizadas contra o Estado e não contra o médico

Pesca probatória ocorreu no acesso a prontuários de pacientes que morreram na UTI em que a médica atuava

A conclusão é da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que deu provimento ao recurso em Habeas Corpus ajuizado pela defesa da médica.

A decisão favorável à defesa se deu porque a 5ª Turma registrou empate por 2 votos a 2, já que o desembargador convocado Carlos Cini Marchionatti não pôde votar por não ter visto a sustentação oral. Aplicou-se a Lei 14.836/2024.

Prevaleceu o voto divergente do ministro Joel Ilan Paciornik, acompanhado pelo ministro Reynaldo Soares da Fonseca. Para eles, a ordem que autorizou a busca e apreensão dos prontuários foi genérica e configurou pesca probatória.

Pesca probatória.

O Ministério Público do Paraná pediu o acesso ao elevado número de prontuários de pacientes que morreram na unidade de terapia intensiva (UTI) do hospital por suspeitar que eles poderiam ter tido a morte acelerada por decisão da médica.

Os prontuários se referem ao período de 1º de janeiro de 2006 a 23 de fevereiro de 2013. No processo principal, que originou a investigação, a médica acabou absolvida por ausência de comprovação da materialidade e da autoria delitiva.

Ainda assim, a investigação gerou outras 80 persecuções criminais por homicídio doloso e qualificado.

Com a nulidade dessas provas reconhecida, agora o MP-PR poderá pedir nova decisão judicial de acesso a prontuários, desde que justificando a necessidade com base em informações constantes nas investigações.

Voto vencido

Ficaram vencidos os ministros Ribeiro Dantas, relator do recurso em Habeas Corpus, e Messod Azulay. Para eles, não há pesca probatória que justifique a anulação da decisão de busca e apreensão.

Isso porque a apuração se limitou a período de tempo certo, ainda que amplo, referiu-se a parcela específica do hospital, apenas para verificar a possível prática criminosa quanto a pacientes que, naquele contexto, foram a óbito.

RHC 195.496

segunda-feira, 31 de março de 2025

Mãos atadas

 Vítima do crime não tem direito de recorrer contra a soltura do réu, diz STJ

·   Danilo Vital

29 de março de 2025, 9h52

·       Criminal

Código de Processo Penal não autoriza que a vítima de um crime, na condição de assistente da acusação, interponha recurso em sentido estrito contra a decisão que concede a soltura do réu preso preventivamente.

Com essa conclusão, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça concedeu Habeas Corpus para garantir a liberdade provisória, mediante cumprimento de medidas cautelares, de um homem acusado de estupro de vulnerável.

O acusado inicialmente foi preso preventivamente. Depois, foi solto sob a condição de cumprir determinadas obrigações judiciais. O Ministério Público de Santa Catarina não recorreu da decisão.

Diante da inércia da acusação, o assistente da acusação (vítima) interpôs recurso em sentido estrito. O Tribunal de Justiça de Santa Catarina deu provimento a ele, decretando novamente a prisão cautelar.

Sem espaço para a vítima

 defesa, então, foi ao STJ para sustentar que essa prerrogativa não existe, pois o artigo 271 do Código de Processo Penal traz um rol taxativo dos atos que podem ser praticados pelo assistente da acusação.

A ele cabe propor meios de prova, requerer perguntas às testemunhas, aditar a acusação, participar do debate oral e arrazoar os recursos interpostos pelo Ministério Público. A norma também diz que o assistente pode interpor recurso contra sentença de impronúncia e apelação contra a sentença após julgamento pelo júri, em casos que tratam de crimes contra a vida.

Rol taxativo

Relator do HC, o ministro Sebastião Reis Júnior citou jurisprudência do STJ segundo a qual o artigo 271 do CPP traz mesmo um rol taxativo. Assim, se a acusação concorda com a soltura do réu, não cabe ao assistente questioná-la.

“No referido dispositivo, não há previsão para interposição de recurso em sentido estrito contra decisão que concede a liberdade provisória ao acusado”, disse o ministro.

HC 936.179

Tribunal mantém condenação de homem por stalking contra ex-patrão

 Tribunal mantém condenação de homem por stalking contra ex-patrão

30 de março de 2025, 17h59

·       Criminal

O crime de perseguição (artigo 147-A do Código Penal) é formal, ou seja, prescinde de qualquer resultado naturalístico para se consumar, no caso de ameaça à integridade física ou psicológica da vítima. Além disso, cabe a quem contesta determinada prova o ônus de demonstrar a sua invalidade (artigo 156 do Código de Processo Penal).

Essas ponderações foram feitas pela 4ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Tribunal de Justiça do Paraná ao confirmar a condenação de um homem pela prática de stalking contra o ex-patrão. O Juizado Especial Criminal de Cianorte (PR) impôs ao réu a pena de seis meses e 22 dias de reclusão, em regime aberto.

O acusado recorreu e sustentou na apelação a ausência de prova da materialidade. Ele disse que não é possível aferir a autenticidade dos áudios com as ameaças que supostamente teria feito à vítima. No entanto, essa alegação foi afastada pelo juiz Aldemar Sternadt, relator do recurso.

“Ainda que tenha se insurgido o apelante, afirmando que não há como saber se os áudios são legítimos, verifica-se que foi dada a oportunidade de contraditório e, além de nada ter sido argumentado, não trouxe elemento algum a comprovar que os áudios teriam sido adulterados”, assinalou o julgador.

Conforme relataram a vítima e a sua mulher, o acusado ficou inconformado com a demissão, foi até a frente da moradia do casal e chutou o portão do imóvel. Por meio de um aplicativo de mensagens, ele ameaçou o ex-empregador, bem como a sua família. Ao encontrar o ex-patrão em um posto de combustíveis, o réu repetiu tais ameaças.

De acordo com o relator, os depoimentos prestados em juízo pela vítima e sua mulher são harmônicos e foram ratificados pelos áudios e por boletim de ocorrência, comprovando a materialidade e a autoria delitivas. Consta dos autos que o crime ocorreu no período compreendido entre 26 de abril e 6 de junho de 2023.

A perseguição reiterada mencionada no tipo penal, ainda segundo o julgador, é aquela conduta insistente, constante, persistente ou obsessiva, seja na mesma data ou prolongando-se no tempo. “Trata-se, portanto, de crime habitual, que pune uma pluralidade de episódios, ou seja, a perseguição deve ser praticada reiteradamente”.

Sternadt citou a “reiteração da conduta” do apelante e a “multiplicidade de meios” por ele utilizada, como ameaças em locais públicos, mensagens por WhatsApp e chutes no portão. Para ele, a vítima teve a liberdade psíquica, a privacidade e a integridade física afetadas, devendo o recurso ser improvido e a condenação, mantida sem reparos.

Os juízes Tiago Gagliano Pinto Alberto e Leo Henrique Furtado Araújo seguiram o relator. Conforme o acórdão, a criminalização do stalking tornou-se imprescindível para que os atos decorrentes da perseguição contumaz e obsessiva possam ser adequadamente repreendidos e punidos com rigor.

Processo 0005373-75.2023.8.16.0069

Falta de pagamento da multa prevista em delação premiada não impede progressão de regime

 Falta de pagamento da multa prevista em delação premiada não impede progressão de regime

·   Danilo Vital

30 de março de 2025, 9h56

·       Criminal

O não pagamento da multa compensatória prevista no acordo de colaboração premiada não pode impedir a progressão de regime de cumprimento de pena do colaborador.

Essa conclusão é da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que deu provimento ao recurso especial de um operador do esquema investigado pela finada “lava jato” paranaense.

Ele fechou acordo de delação premiada com previsão de pagamento de multa em parcelas anuais. Atualmente, cumpre pena em regime domiciliar e com uso de tornozeleira eletrônica.

A progressão de regime para a fase de prestação de serviços comunitários foi rejeitada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região porque ele atrasou o pagamento da multa.

Multa em atraso

A corte regional entendeu que o não pagamento da multa deveria levar à rescisão do acordo, mas destacou que isso não poderia ser feito de ofício pelo juízo.

Apesar disso, o TRF-4 impôs a alienação de bens pelo juízo, independentemente da concordância do colaborador, para quitação dos valores atrasados.

No recurso ao STJ, a defesa, feita pelos advogados Tracy Reinaldet Matteus Macedo, ponderou que há pedido de repactuação da multa feito ao juízo da 12ª Vara Federal de Curitiba, em razão das graves crises econômicas que assolaram o Brasil.

Os advogados alegaram que o operador, em idade já avançada, encontrou dificuldades para trabalhar desde a condenação, por causa da pandemia da Covid-19, e apenas recentemente voltou ao mercado de trabalho, com salário modesto.

O recurso especial foi inicialmente denegado em decisão monocrática do desembargador convocado João Batista Moreira, em setembro de 2023. No julgamento do agravo regimental, a 5ª Turma resolveu atender ao pedido da defesa, já sob a relatoria da ministra Daniela Teixeira.

Progressão de pena autorizada

Em seu voto, ela reconheceu que é possível vincular a progressão de regime ao pagamento da multa, medida que o Supremo Tribunal Federal já adotou. Porém, a 5ª Turma vem entendendo que a ausência de pagamento não impede o benefício, desde que haja inequívoca comprovação da hipossuficiência do acusado.

No caso concreto, embora não se trate de pena pecuniária prevista na lei penal, mas de multa acertada em delação premiada, ela assim vem sendo interpretada, já que a falta de seu pagamento vem impedindo a progressão de regime combinada.

Assim, se o TRF-4 não refutou a alegação de hipossuficiência do colaborador, e inclusive determinou a alienação judicial de bens para quitação da dívida, não há motivo para impedir a progressão.

“Dessa forma, visto o descumprimento da cláusula financeira como espécie de mora contratual, incumbe ao credor do acordo a adoção das providências asseguradas pela lei (arts. 394 e seguintes do Código Civil c/c artigo 4ºda Lei 12.850/2013) para ver seus termos exigidos, promovendo, inclusive, se o caso, a rescisão de seus termos”, disse a ministra.

“Não pode, contudo, à míngua de previsão contratual, promover a interpretação de seus termos de maneira extensiva, em prejuízo do colaborador contratante, conferindo efeito obstativo que não possui”, complementou Daniela.

REsp 1.989.703